Em 2018, a Fundación Europea Sociedad y Educación (EFSE), em Espanha, e o Centro de Estudos dos Povos e Culturas de Expressão Portuguesa da Universidade Católica Portuguesa (CEPCEP), assumiram o desenvolvimento e monitorização de um programa experimental em Liderança para a Educação Integral (LEI), num conjunto de 15 escolas públicas espanholas e portuguesas, que educam crianças em situações de especial adversidade.
«O líder deve deixar que outros liderem; promover os líderes de líderes; dar a voz às pessoas, como podem ser líderes dentro de sala de aula ou no departamento pedagógico. O líder é o catalisador da mudança»
Comissão científica PT
Com este tipo de liderança pretende-se contribuir para a implementação de uma intervenção educativa focada no desenvolvimento integral de crianças e jovens (Whole Child Development WCD). Esta intervenção visa, por meio das direções, criar uma cultura de mudança, impulsionada por gestores e equipas de gestão e que envolva toda a comunidade escolar.
Liderança para a educação integral (LEI) em contextos desfavorecidos
Após nove meses de reflexão e estudo, a equipa de investigação de Espanha e de Portugal concretizou o programa LEI num documento de bases em cujo resumo executivo se inclui um quadro conceitual e domínios de ação.
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Os 10 traços específicos da LEI:
1 Enfatiza a educação integral do estudante
Aspirar a uma educação integral não é apenas ordenar o caos ou contentar-se com a aquisição de certas competências, dominar rotinas, manipular ferramentas, internalizar competências ou desenvolver competências ao serviço do trabalho ou da vida. É ir mais além: educar cada ser humano é ajudá-lo a completar-se. Ou seja, aprender a ser homem, ser mulher. Isso significa estimular hábitos, gerar e comunicar valores, sobretudo intelectuais e morais, porque são esses que nos fazem crescer e distinguirmo-nos como seres humanos; que nos capacitam para a reflexão e a ação, moldam nossa consciência e fortalecem nossa liberdade. Isto é, pessoas cuja razão ordena e cuja orientação ético-moral atribui propósito e significado a tudo o que fazem.
2 Atende às diferentes dimensões que cada pessoa integra, considerada como um todo inseparável
A educação de cada aluno, ao longo de seu tempo na escola, deve basear-se no objetivo de implicar todas as dimensões da sua pessoa no processo de ensino-aprendizagem. E, igualmente, em altas expectativas para todos, independentemente das condições ou dificuldades atribuíveis à sua origem social ou cultural, à sua raça, sexo ou religião.A educação de cada aluno, considerada a partir de sua dignidade radical e como sujeito de uma ação educativa integral, deve aspirar a abarcar todas as dimensões que consideramos constitutivas da pessoa: a dimensão biológica, a partir da qual se inicia a consciência do cuidado, do compromisso e da preservação ambiental; a dimensão cognitiva; a dimensão afetivo-emocional; a dimensão estética-artística; a dimensão social e cívica; e a dimensão ético-moral e espiritual.
3 Encontra no mito de Aquiles uma inspiração para a relfexão educativa sobre a tarefa das equipas diretivas em contextos vulneráveis
Aquiles é levado por sua mãe, Tethys, para a Ilha de Sciros, para permanecer escondido do olhar de Ulisses. No gineceu, entre as mulheres e disfarçado de mulher, ele vive alheio à Guerra de Troia, que é o seu destino. Tróia simboliza a grande epopeia grega e o paradigma do dever para com a comunidade. O mito pode ser lido como chave de um modelo de desenvolvimento humano que se desloca do estádio estético, típico da infância e adolescência, centrado num Eu sem obrigações, com todas as possibilidades em aberto mas sem concretizar, para o estádio ético que caracteriza vida adulta É de valor inegável para a reflexão educacional, porque exige pensar nos fins da vida — e também da educação —, bem como no caminho necessário para a sua realização. Um caminho que não pode ser percorrido sem a necessária liderança de Ulisses; do educador.
4 Não vem revolucionar nada: parte do que já foi demonstrado pela literatura científica, através de uma revisão de fontes documentais de diferente natureza
Para a elaboração do quadro teórico do programa LEI, foi realizada uma ampla revisão de fontes documentais de natureza diferente. Foi contemplada a literatura científica teórica e empírica mais relevante sobre liderança escolar em contextos desfavorecidos, bem como as orientações emanadas de várias organizações internacionais a este respeito. Foi feita uma revisão das estruturas de competências dos programas de formação em gestão escolar usados em diferentes países e de vários projetos que visam promover a gestão eficaz das escolas em ambientes desfavorecidos, que podem ser considerados modelos de referência para o programa que aqui é apresentado. Entre estes modelos estão:
- Liderança pela justiça social.
- Liderança escolar no âmbito da educação inclusiva e da equidade.
- Liderança escolar em contextos desfavorecidos, de acordo com organizações internacionais.
- Padrões profissionais de gestão escolar.
- Liderança distribuída para equidade e aprendizado (DLE).
- UNESCO: liderando o desenvolvimento escolar inclusivo.
5 O programa LEI visa escolas que trabalham em ambientes particularmente difíceis
O programa tem como foco os contextos mais desfavorecidos em que a ação educacional deve ter maior poder transformador para alcançar a equidade e melhorar as condições do ambiente pessoal dos alunos (família, emocional, segurança, intelectual e bem-estar). A LEI tem uma visão otimista sobre o presente e o futuro dos alunos. Os professores confiam nos talentos e nas possibilidades de desenvolvimento dos alunos. Além disso, e justamente por causa do contexto de dificuldade especial, uma liderança deste tipo é caracterizada pela sua intenção de se abrir e se relacionar com o meio ambiente e, finalmente, ser um ponto de referência para sua transformação e melhoria.
6 Propõe uma liderança amplamente distribuída, graças à qual as pessoas que rodeiam o líder possam melhorar, mudando a partir de dentro, tirando o melhor de si mesmos
Nas escolas que servem populações em risco, o compromisso ético do próprio líder é uma condição necessária e alinhada com a busca de equidade, inclusão e expectativas de melhoria das pessoas e do meio ambiente.
O diretor, com a sua reconhecida autoridade educacional, é o principal responsável por formar uma equipe líder com esse objetivo comum, envolvido na disseminação e contaminação do compromisso com a visão em toda a organização escolar.
A concepção de uma liderança amplamente distribuída implica incorporar os mais identificados com o projeto, bem como a equipa de líderes intermediários numa perspectiva sistémica. Diretores de turma e coordenadores de departamento (línguas, ciências exatas, ciências sociais, …) coordenadores de estabelecimento, …, desempenham um papel destacado no programa LEI. Somente uma liderança distribuída que seja capaz de alcançar todo o corpo docente pode gerar transformações visíveis na comunidade educacional e no ambiente imediato.
7 É também uma liderança adaptativa, flexível e orientadora, que presta atenção preferencial ao acompanhamento de professores, estudantes e famílias
O desenvolvimento de todas as pessoas que fazem parte da comunidade escolar e a criação de relações entre elas são fatores básicos da LEI. A LEI pretende desenvolver escolas que sejam espaços de liberdade e respeito, promovendo o trabalho entre estudantes, professores, famílias e comunidade. Por isto, tem de considerar as necessidades de professores e funcionários não docentes da escola e estabelecer mecanismos para conseguir o envolvimento das famílias e a colaboração da comunidade envolvente. Além disso, a LEI considera de especial importância o acompanhamento das pessoas na prossecução dos objetivos da escola, a recolha de evidências sobre o seu progresso e a avaliação das realizações, para que seja possível obter feedback constante sobre o que funciona , os problemas e os modos de ultrapasar as dificuldades.
8 Estabelece um sistema relacional próprio com cada membro da comunidade educativa
Esta liderança estabelece relações com as famílias (respeitando os papéis de cada um e justificando quem faz o quê, embora mantendo a proximidade); com professores (a quem estabelece objetivos de aprendizagem, va,orizando a sua competência profissional e o seu papel como transmissores de cultura e conhecimento, como ferramenta para a promoção dessa educação integral); e com os alunos (cujo desenvolvimento educacional é considerado como um todo, multidimensional). Consequentemente, esta liderança considera a escola como uma comunidade, um espaço de aprendizagem cívica.
9 É orientada para a melhoria da escola e para a sua autonomia na determinação da visão, missão e projeto educativo
O programa procura fornecer ferramentas para os líderes melhorarem a sua própria escola e ajudá-los a detectar as suas próprias necessidades. O objetivo comum do programa está definido. Mas os meios e alguns dos objetivos específicos devem ser particulares para cada escola e estabelecidos pela própria escola. A partir de uma visão partilhada de EI, cada escola deve estabelecer a sua própria missão e visão.
10 Baseia-se numa concepção sistémica que engloba quatro domínios de ação: (a) comunicar a visão da escola, (b) repensar a organização, (c) adaptar o currículo e (d) construir relacionamentos e desenvolver o potencial de cada membro da comunidade educativa
A LEI aborda sistematicamente o projeto educativo, currículo, metodologias e resultados, decorrendo estes de uma ação coletiva que envolve, ainda que à sua maneira, toda a comunidade educativa, alunos, professores e famílias.
Equipa de investigação
Uma equipa de investigadores, apoiada e aconselhada por especialistas e profissionais da gestão escolar, aceitou o desafio de selecionar e justificar os componentes desse programa de liderança.
PORTUGAL

Rodrigo Queiroz e Melo (Universidade Católica Portuguesa)

José Maria de Almeida (Universidade Católica Portuguesa)

José Reis Lagarto (Universidade Católica Portuguesa)
ESPAÑA (coordinadores)

Arturo Galán – IP (UNED)

Inmaculada Egido (UCM)

David Reyero (UCM)

Mireia Tintoré (UIC)